segunda-feira, março 15, 2004

Eu admito. Admito que quando soube que as torres gêmes estavam sendo atacadas, eu fiquei feliz. Admito que quando o Pentágono, símbolo máximo do poder das Forças Armadas dos Estados Unidos, foi atacado, eu fiquei feliz. Gostaria também que a Estátua da Liberdade tivesse sido atacada.

Mas admito que esta minha felicidade está ligada ao maldito imperialismo e colonialismo com que os Estados Unidos insiste em tratar o mundo, desde sua rápida ascenção ao poder, após a Segunda Guerra Mundial. Sua insistência em mandar em tudo, em impor sua visão ao resto do mundo, em obrigar o comércio mundial a funcionar como ele quer. E pior, a vontade deste país em que as coisas continuem assim.

Mas eu não fiquei feliz com o acontecido em Madrid no último dia 11. Eu tenho certeza que a Espanha também é formada (assim como quase todos os países) de reacionários, hipócritas, assassinos, racistas, e todo tipo de imbecis que pode existir. Mas também tenho certeza que a violência só deve ser utilizada - se é que deve ser utilizada - como último recurso, em situações de extrema opressão, de desumanidade absurda, de risco de colapso da sociedade. O que eu tenho certeza que não está acontecendo na Espanha.

Eu sempre vi a Espanha como o próximo pólo cultural mundial depois da França. Desde que a França deixou de ser a fomentadora de grandes ideais políticos e filosóficos, artísticos e comportamentais, humanísticos e científicos, no início dos anos 70, o mundo vive um vazio em termos de centro cultural de qualidade (pois temos um excelente centro cultural de baixa-qualidade: EUA). Não existia mais no mundo um país específico que fosse um modelo a ser seguido, um ícone de ideais humanistas, com visão geral e que avançasse para o futuro (o que em tese seria ótimo, pois poderia significar que todos estas evoluções artísticas, intelectuais, espirituais e humanísticas estariam acontecendo de forma heterogênea pelo mundo, o que não é verdade).

Eu ainda acho isso. Acho que a Espanha tem um potencial enorme de se tornar este país por alguns anos, talvez uma ou duas décadas. E exatamente por isso que fico chocado com acontecimentos como esse do dia 11 de Março.

Eu ainda não sei o que este atentado significa. Ainda não se tem certeza dos autores, dos motivos. Mas é muito triste ver o país do momento (o próximo, se conseguir fazer outra revolução social, será a China) se estragar desta maneira. E é mais triste ainda quando eu olho para o meu próprio país de origem, e penso que poderia ser ele a estar ocupando essa posição nos dias de hoje.


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